Nortec Collective presents: Bostich+Fussible "Tijuana Sound Machine"
Sunday, May 31, 2009
Monday, May 25, 2009
Bem fixo
Há pouco tempo tive oportunidade de ver, na televisão, uma escola primária do Estado Novo convertida em museu (em Grândola, se não me engano). Lá estavam as efígies dos governantes, ao lado do crucifixo enorme (não sei se estavam uma à esquerda e outra à direita ou ambas do mesmo lado, à esquerda, diria eu), lá estavam os mapas, a régua, as carteiras alinhadas, as janelas amplas (mas altas), enfim, a iconografia completa. Com o 25 de Abril, as fotografias de políticos foram retiradas das paredes das salas de aula, evidentemente. Era tempo de arejar.
Em muitas escolas públicas portuguesas, no entanto, por cima do quadro negro, ainda se pode ver o crucifixo. Há tempos houve falatório nos media a este respeito, mas eu pensei que se tratasse de casos mais ou menos isolados, em vias de normalização (sim, ora!). Acontece que, neste ano lectivo, tenho tido oportunidade de visitar muitas escolas do meu agrupamento e tenho verificado que não é assim. Vários colegas, aliás, têm-me confirmado isso mesmo.
Bem sei que este não é o problema mais grave que o mundo tem pela frente, que no domínio da educação nacional há assuntos mais preocupantes (“que mal é que isso tem?”, é o que me dizem alguns), mas é precisamente esse tipo de mentalidade que tem permitido que as coisas se arrastem.
Imagino que grande parte dos colegas que trabalham nestas salas, sob a vigilância do crucificado, não se sinta propriamente confortável com a situação, mas algumas dúvidas quanto à responsabilidade pela tomada de medidas e o receio de eventuais reacções negativas (uma complacência lusitana típica) vão-se sobrepondo ao bom senso. E à lei.
Dizer que a religião e educação não são incompatíveis, ou que a religiosidade é um aspecto essencial do ser humano, etc. e tal, soa muito bem e é muito bonito, mas dar a entender que esses princípios genéricos têm alguma coisa a ver com o patrocínio, por parte do estado, de um símbolo religioso (e de uma religião em particular) é inaceitável. Idem aspas para a perspectiva contrária, se quisermos ir por aí: a religião (a católica, neste caso) no papel de ‘patrocinadora’da escola pública. Presentemente talvez se trate de um ‘ligação involuntária’, um legado do passado, mas que se pode falar numa ligação imprópria entre duas partes (caso se considere exagerado falar em ‘patrocínio’), pode.
Dizer que se trata de uma ‘questão cultural’ é igualmente incompreensível. Li algures uma opinião de um bispo que ia nesse sentido. Mas cultural como? Da mesma maneira que o Domingo se institucionalizou como dia de descanso independentemente do seu significado religioso? Mas como se pode dizer que o crucifixo, ou a cruz, o mais importante símbolo do cristianismo, não tem sobretudo um significado religioso? Se numa escola pública houver uma alusão a um motivo religioso num painel, numa pintura, num azulejo, por exemplo, ou mesmo numa história ou canção, aí sim, admite-se que se possa tratar de uma ‘questão cultural’. E convém ter isso presente antes de corrermos a queimar os textos e a partir os santinhos à martelada. Já o tradicional crucifixo, estrategicamente colocado num poiso altaneiro da sala de aula, dificilmente se pode deixar de ver sobretudo como um símbolo religioso, mesmo que seja também outras coisas.
Há casos e casos, mas se se transformasse uma escola actual numa ‘escola museu’ ela podia ser assim: o edifício é uma construção do Estado Novo - apenas está mais degradado- mas as mentalidades de quem neles trabalha mudaram (e no entanto…); as ardósias foram substituídas por ‘Magalhães’ (ainda que o computador da sala não funcione); as réguas, pequenas e de plástico, agora estão na mão dos alunos; as carteiras podem apresentar diversas disposições: em grupos de quatro, em sofisticada forma de ‘U’, etc.; o território que se pode ver representado no mapa de Portugal encolheu muito; o crucifixo continua bem fixo.
Em muitas escolas públicas portuguesas, no entanto, por cima do quadro negro, ainda se pode ver o crucifixo. Há tempos houve falatório nos media a este respeito, mas eu pensei que se tratasse de casos mais ou menos isolados, em vias de normalização (sim, ora!). Acontece que, neste ano lectivo, tenho tido oportunidade de visitar muitas escolas do meu agrupamento e tenho verificado que não é assim. Vários colegas, aliás, têm-me confirmado isso mesmo.
Bem sei que este não é o problema mais grave que o mundo tem pela frente, que no domínio da educação nacional há assuntos mais preocupantes (“que mal é que isso tem?”, é o que me dizem alguns), mas é precisamente esse tipo de mentalidade que tem permitido que as coisas se arrastem.
Imagino que grande parte dos colegas que trabalham nestas salas, sob a vigilância do crucificado, não se sinta propriamente confortável com a situação, mas algumas dúvidas quanto à responsabilidade pela tomada de medidas e o receio de eventuais reacções negativas (uma complacência lusitana típica) vão-se sobrepondo ao bom senso. E à lei.
Dizer que a religião e educação não são incompatíveis, ou que a religiosidade é um aspecto essencial do ser humano, etc. e tal, soa muito bem e é muito bonito, mas dar a entender que esses princípios genéricos têm alguma coisa a ver com o patrocínio, por parte do estado, de um símbolo religioso (e de uma religião em particular) é inaceitável. Idem aspas para a perspectiva contrária, se quisermos ir por aí: a religião (a católica, neste caso) no papel de ‘patrocinadora’da escola pública. Presentemente talvez se trate de um ‘ligação involuntária’, um legado do passado, mas que se pode falar numa ligação imprópria entre duas partes (caso se considere exagerado falar em ‘patrocínio’), pode.
Dizer que se trata de uma ‘questão cultural’ é igualmente incompreensível. Li algures uma opinião de um bispo que ia nesse sentido. Mas cultural como? Da mesma maneira que o Domingo se institucionalizou como dia de descanso independentemente do seu significado religioso? Mas como se pode dizer que o crucifixo, ou a cruz, o mais importante símbolo do cristianismo, não tem sobretudo um significado religioso? Se numa escola pública houver uma alusão a um motivo religioso num painel, numa pintura, num azulejo, por exemplo, ou mesmo numa história ou canção, aí sim, admite-se que se possa tratar de uma ‘questão cultural’. E convém ter isso presente antes de corrermos a queimar os textos e a partir os santinhos à martelada. Já o tradicional crucifixo, estrategicamente colocado num poiso altaneiro da sala de aula, dificilmente se pode deixar de ver sobretudo como um símbolo religioso, mesmo que seja também outras coisas.
Há casos e casos, mas se se transformasse uma escola actual numa ‘escola museu’ ela podia ser assim: o edifício é uma construção do Estado Novo - apenas está mais degradado- mas as mentalidades de quem neles trabalha mudaram (e no entanto…); as ardósias foram substituídas por ‘Magalhães’ (ainda que o computador da sala não funcione); as réguas, pequenas e de plástico, agora estão na mão dos alunos; as carteiras podem apresentar diversas disposições: em grupos de quatro, em sofisticada forma de ‘U’, etc.; o território que se pode ver representado no mapa de Portugal encolheu muito; o crucifixo continua bem fixo.
Friday, May 1, 2009
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