O trabalho numa quinta nunca acaba, entre rotinas entediantes e incidentes sem significado, agora no tempo gasto com reparação da cancela, de onde, ao longe, vejo um grupo de americanos aproximar-se. Acabei depois por não perceber bem se eram uma espécie de arqueólogos, se geólogos,, ou algo ligado ao turismo ou à agricultura ou a que «projectos», porque o vereador também la vinha, e ele vem sempre mais do que disposto a apostar em «projetos», a mostrar «projectos» ou a falar de «projectos», de maneira que de vez em quando aprece para aí todo o feitio de tropa. Mas americanos deviam ser. Gostei especialmente duma, bonitinha, olhou para mim também, foi bom. Se tivessem vindo de manhã, talvez ela me tivesse visto partir a cancela com o tractor. Que vergonha, meu Deus, que vergonha passei, quando afinal estávamos sozinhos, o tractor e eu. Mas não, para grande sorte minha, ela aparecia agora. Ferramentas. Lidando com alicates, com estacas a sério. Pois é, amiga! Sou homem ou não sou?
Tão-pouco os outros, alguns deles gente experimentada na vida, pareciam perceber que eu não saberia usar bem a chave de fendas, quanto mais conduzir o trator, que ali continuava meio desorientado. Mas talvez estivessem apenas a ser simpáticos, no fundo os americanos são pessoas quase iguais às outras. E eu, meio envergonhado, lá lhes perguntei o que é que achavam de Portugal, o que é que estavam a sentir. Algum tempo depois, evidentemente, já tinha confiança para os abordar de outra maneira: o que é que é vocês acham de Portugal? O que é que estão a sentir?
Claro que sim. Mas mais e mais: O que é que é o nosso interior para vocês? E o que é que é uma quinta biológica como a nossa? O que é que é? E, claro, cá o Portugal propriamente, de que maneira é que é que Portugal é visto na América, e tal?, Já provaram leitão?, Não vos faz impressão? Sabem que somos um país independente da Espanha? Ou pensam que somos uma província da Espanha, hã, Portugal, o que é que acham lá na América, o que é que é?
Bom, J., ainda não conhecemos muito, gostamos de Neizauréh, vamos para Vaizu, e Lissboah é simplesmente adorável.
Que resposta tão inteligente, para aquelas circunstâncias. O truque está aí. Percebi então como funciona a mente americana, que era o que eu mais queria na porra da vida. Ah, pois, Vaizu, Vaizu.
E que americana tão bonita vinha na comitiva, realmente, morena. Acho eu. Pareceu-me bonita. É um cabelo castanho escuro, mas luminoso, como que translúcido. Já tinha olhado para mim segunda vez, entretanto, mãe do Céu, novamente bom. Há aquele canela acobreado, que para mim é rei! Mas isso são casos raros. Não me parece que na América haja muito.
Na América há muito nas senhoras a cor de cabelo canela acobreado, ou não?, perguntei-lhe finalmente, desesperado. Não percebeu. Silêncio, silêncio. O que é que achas de Portugal? Pelezinha clara, modos suaves. Ah, adorável, estou a ver. Silêncio, pardais. Os americanos às vezes invadem países e depois fazem filmes sobre isso, acrescentei, é muito curioso.
Ela pareceu não gostar muito de mim e foi-se embora.
De um ramo, ao longe, alguma ave iniciava calma e tranquilamente o seu voo. Amor da minha vida! Não, não faças isso! E se viesses passear comigo no tractor? Os outros américas (que afinal estavam apenas de férias) que regressem à Vila com o vereador. Ou então eu depois ligo-te, vens cá e conduzes tu sozinha e eu fico só a olhar para ti.
Não deu.
Mas no dia seguinte reencontrámo-nos e deu (tratava-se também de prospecção de minério a comitiva queria aproveitar. Eu fiquei com a mais bonita. E à tarde pude explicar-lhe, na pastelaria, que até tinha concordado com a guerra no Afeganistão.
Que ideia, perguntava-me ela então, têm vocês da América? Há pessoas aqui que não suportam a América, certo? Mas gostam dos nossos filmes, não gostam? Etc.).
Friday, January 6, 2012
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